A 1ª prefeita trans na França e o vira-latismo LGBT brasileiro

Precisamos tomar fôlego e nos informarmos sobre nossa história antes de suspirarmos para a dos outros países

Publicado em 26/05/2020
lgbt brasil
Apenas paremos de achar que tudo para LGBT no Brasil é atrasado e que o melhor cassoulet está lá fora

Por Welton Trndade

Não é beber cidra e arrotar champagne. É beber caipirinha e sentir retrogosto de chá de boldo.

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Muito importante e digno de alegria registrar o fato de, pela primeira vez, uma trangênero tornar-se prefeita na França. Foi notícia nas últimas horas na mídia geral e LGBT a posse de Marie Crau como líder máxima de uma cidade na fronteira com a Bélgica.

De toda forma, aqui se escreve (sem nenhuma bebida alcóolica como auxiliar) não para tratar desse fato, mas sim do quanto as cores do orgulho LGBT no Brasil ainda são nubladas pelo cinza cor de sufocamento da nossa baixoautoes... Ah, não floreemos: de nosso vira-latismo! 

Foram alguns dos comentários sobre a notícia: "Ah, vejam a França como é, enquanto que no Brasil... Aff!"; "Que grande símbolo de uma sociedade evoluída enquanto o Brasil está entregue ao nazi-facismo"; "Veja notícias assim, penso no Brasil e fico nos suspiros". 

Diria, eu: Eu fico nos bufos... de desalento! Conosco, nós LGBT do Brasil! 

Vamos a eles? Aos fatos? Pegue a taça de cristal ou mesmo o copo de requeijão! 

Sabe a cidade pela qual Marie agora responde como prefeita? Pois bem, Tilloy-lez-Marchiennes tem menos de 600 habitantes. É menos que uma The Week às 22h!  E não foi o voto popular que elegeu uma trans. Foi a câmara municipal! Guarde esses fatos! 

Tome um gole, vamos a outros dados! Em 2018, Minas Gerais, o segundo maior colégio eleitoral do Brasil, deu nada menos que 351.874 votos para a trans Duda Salabert (Psol).

Não, ela não ganhou, mas o que teria maior peso para falar de um país: o voto de uma cidadela de menos de 600 habitantes em uma câmara de vereadores com algo como 15 integrantes ou centenas de milhares de votos em um estado maior que muitas nações por aí? 

Mais! Quem fica com suspiros por Marie deveria é puxar ar e ir atrás de informação antes de afirmar qualquer merde (oui, en français).

protesto casamento homo frança
Centena de milhares saíram para as ruas em Paris contra o casamento homo! No Brasil, não houve atos assim

Há quase 30 anos sabe o que acontecia no interior do Brasil, em uma cidadezinha do Piauí? A transexual (hoje) - na época se chamava de travesti - Kátia Tapety foi a primeira trans eleita para um cargo político no Brasil! 

Ganhou em primeiro lugar em 1992, 1996 e 2000 em Colônia do Piauí! Chegou a ser presidente da Câmara de Vereadores. Em 2004, foi eleita, pelo voto popular, vice-prefeita! Seu ídolo, Ciro Gomes (PDT)! Nossa ídola? Deveria ser ela, mas tem gente nas redes sociais que suspira apenas por Marie!

E isso só para molhar os beiços! Brasil hoje tem senador gay, Estado com quatro deputados arco-íris (São Paulo), já teve prefeito de capital assumidamente gay (Floripa)... Tanta coisa já fizemos, fazemos, e elegeremos! 

França, símbolo máximo de civilidade... Sim, Arco do Triunfo, mas há muitos Arcos da Lapa também nesse cassoulet humanístico! 

Lá por 2013, houve protesto em Paris com cerca de 300 mil pessoas sabe para quê? Espenear contra a adoção por homossexuais e o casamento entre pessoas do mesmo sexo! No Brasil, nunca, nem de perto, nem em pesadelo, houve algo assim! E aí, quem é mais civilizado? 

Ah, sim, ler uns dias atrás a midia francesa era ver o aumento de 29% nos casos de discriminação contra LGBT no país entre 2018 e o ano passado!

Perfeição o Brasil não tem a oferecer, vivemos muitos problemas - Palácio do Planalto é uma de suas moradas -, mas vira-latismo com glitter também não é algo para estar no queijo da boate que é nossa vida!

Menos camembert! Mais buchada de bode nesse orgulho arco-íris brazuca!  


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